Por: Nzongo Bernardo dos Santos

Jornal ÉME – Luanda – 17.09.2025 – Quando, em 1980, a então Assembleia do Povo (órgão legislativo de Angola entre 1980 e 1992, sucedido hoje pela Assembleia Nacional) decidiu instituir, de forma póstuma, o Dia do Herói Nacional, o objectivo era claro:

Reservar o indiscutível e incomparável lugar de Agostinho Neto na história contemporânea de Angola.

Dizem os meus botões (com toda razão) que, no entendimento dos “pensadores” que avançaram com a proposta dessa efeméride , justa e especial em todos os sentidos, a motivação era absolutamente excepcional.

Homenagear Neto não deveria ocorrer apenas em datas especiais.

Na pátria de Neto , como chamávamos Angola quando éramos miúdos e pertencíamos à OPA, falar da vida e obra do Guia Imortal da Revolução Angolana deveria ser sempre motivo de conversa e reflexão.

Neste momento em que assinalamos o 103.º aniversário do nascimento do Primeiro Presidente da Angola Independente e Herói Nacional, torna-se ainda mais evidente que, neste ano em que o País celebra 50 anos de soberania inalienável e indivisível, a vida e obra do médico, político, revolucionário e poeta continuam a ser, acima de tudo, pilares fundamentais da nossa memória coletiva.

O pensamento estratégico do “Kilamba” esteve sempre associado ao pragmatismo, à visão ampla de futuro, à habilidade de operar em ambientes complexos e à competência de antever problemas, idealizando sempre um amanhã diferente.

E não só.

Sem receio de incorrer numa espécie de amnésia selectiva, pode-se afirmar que o legado e os ensinamentos de Agostinho Neto continuam a ser um lembrete poderoso de que o verdadeiro serviço público envolve colocar as necessidades da população acima dos próprios interesses, priorizando o bem comum e estando disposto a fazer sacrifícios em nome do povo.

A título de exemplo , não sei se é verdade ou meia-verdade, há quem jure de pés juntos que uma das frases muito apreciadas por Presidente Neto foi dita por um contemporâneo seu, também revolucionário pan-africanista e Pai da Independência de um país irmão: Moçambique.

“O dever de cada um de nós é dar tudo ao povo, sermos os últimos quando se trata de benefícios, primeiros quando se trata de sacrifícios.” — Samora Machel

Falar, num dia como hoje, sobre a dimensão da figura do estadista e nacionalista — de reconhecimento continental e internacional, que, com espírito de solidariedade, contribuiu para a causa dos povos que ansiavam por liberdade, não é tarefa fácil para quem, como eu, nem sequer teve a oportunidade de sonhar em privar com ele.

Mas a verdade é que ainda há muito por dizer, ouvir e escrever sobre Agostinho Neto.

“Agostinho Neto deixou ideais e pensamentos que são luzes para os defensores do desenvolvimento, inclusão e justiça social no mundo.” — Lula da Silva, Presidente do Brasil, durante visita de Estado a Angola em Agosto de 2023.

O país precisa ter a maturidade de nomear o seu passado com todos os seus acertos e erros, uma encruzilhada que, necessariamente, não oferece muitos caminhos.

O País precisa de memória. Só assim evitará repetir os mesmos erros do passado.

Num momento em que Angola clama por sua identidade social e cultural, e pelo resgate da dignidade humana, é essencial continuar a difundir a visão sistêmica do Primeiro Presidente de Angola — conquistada por mérito próprio, por meio de acções que revelaram a sua dimensão de estadista, com forte ligação à justiça política e social, ao desenvolvimento das famílias e da sociedade.

Angola precisa continuar a reconhecer e valorizar, de fato, o seu Herói Nacional (assim mesmo, com H e N maiúsculos), diferenciando-o — como água e azeite — dos pseudo-heróis que, nos últimos tempos, alguns tentam nos impor.

Caso um dia surja um doente do pé — de preferência intelectualmente maluco — que decida retirar a estátua de Agostinho Neto do Largo da Independência, ou que resolva juntar a ela qualquer outra figura, então fique sabendo que o mudo telefonou para um surdo dizendo que um cego viu um aleijado correr atrás de um careca para lhe cortar o cabelo… tudo isso para festejar o dia de outro fundador da nação que não seja “Manguxi”.

Peço desculpas se me alonguei nesta exposição, mas abordar em poucos minutos alguém com um percurso de vida tão rico como o do Presidente Agostinho Neto é, de fato, não só missão impossível, mas também uma experiência emocionalmente indescritível.

Que vivam para sempre a memória e os ensinamentos de Agostinho Neto!