Jornal ÉME – Luanda – 10.04.2025 – Venerando Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal de Contas
Venerandos Juízes Conselheiros Presidentes dos Tribunais Superiores
Digno Procurador-Geral da República
Ilustres Deputados à Assembleia Nacional
Caros Ministros
Distintos Conferencistas
Ilustres convidados
Minhas senhoras e meus senhores
No próximo mês de Novembro o nosso País completará 50 anos de Independência.
Para além da dimensão celebrativa, o ano do nosso jubileu constitui também uma soberana oportunidade de reflexão conjunta sobre o nosso passado, o nosso presente e o nosso futuro, nos mais diferentes domínios.

Saúdo, por isso, o Tribunal de Contas pela pertinente iniciativa de promoção destas jornadas técnico-científicas e agradeço ao Dr. Sebastião Gunza, Venerando Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal de Contas, pelo amável convite que me dirigiu para que me juntasse à esta jornada de reflexão.
“O controlo externo e as políticas públicas para a primeira infância” é o que nos une neste certame. O tema central destas jornadas técnico-científicas é pertinente, sem dúvidas, e desafiante, no mínimo. Convoca-nos para a reflexão sobre as políticas públicas voltadas para a criança e sobre como o seu controlo externo pode contribuir favoravelmente para a sua racional e eficiente implementação.
Ilustres convidados
Minhas senhoras e meus senhores
Investir na criança é uma obrigação do presente e um compromisso com o futuro.
Investir na criança é um imperativo de solidariedade inter-geracional e uma exigência para a continuidade sustentável da espécie humana.

Por esta razão, a nossa Lei Fundamental consagra o direito da criança à atenção especial da família, da sociedade e do Estado, orienta, no plano programático, para a adopção de políticas públicas voltadas para a salvaguarda do princípio do superior interesse da criança e define como uma tarefa fundamental do Estado efectuar investimentos estratégicos para o desenvolvimento integral da criança e dos jovens.
A concretização destes comandos constitucionais impõe adopção de políticas públicas de protecção da criança, particularmente na primeira infância, numa perspectiva transversal.
No nosso País, a criança goza de protecção especial, sendo de destacar os “11 compromissos com a criança”, os quais corporizam um conjunto de medidas de política, de carácter multissectorial, que visam promover e assegurar os direitos da criança. Para a sua materialização, o Executivo aprovou em 2024 a “Política Nacional para a Primeira Infância”.
A “esperança de vida ao nascer” é o primeiro compromisso, através do qual o Estado compromete-se a reduzir a mortalidade materna e infantil, através de acções como o aumento da oferta em quantidade e em qualidade dos serviços de saúde, da melhoria das condições de saneamento e salubridade do meio ou de acções de consciencialização para a adopção de uma postura preventiva por parte das comunidades.
A implementação dessas medidas permitiu, por exemplo, uma diminuição substancial da mortalidade de crianças menores de 5 anos, tendo baixado de 68 para 52 por mil nascidos vivos e, a de menores de 1 ano, de 44 para 32 por cada mil nascidos vivos.

A “segurança alimentar e nutricional” é outro compromisso importante assumido pelo Estado angolano com o objectivo de garantir que as crianças tenham a todo o momento disponibilidade de alimentos com qualidade e variedade.
Neste particular, para além de um conjunto de medidas de fomento da produção nacional que beneficiam a população em geral, é sugestivo destacar, a título de exemplo, a medida de transformação do programa de merenda escolar em “Programa de Alimentação Escolar”, recentemente aprovada, através da qual será alargada a disponibilização de alimentos para as nossas crianças, particularmente as mais carenciadas, a partir das escolas, observando padrões nutricionais adequados aos seus estados etários.
O “registo de nascimento” é outro compromisso importante da agenda governativa. São disso exemplos dignos de realce a implementação de balcões de registo nas unidades hospitalares de referência, de modo a assegurar que os recém-nascidos sejam registados logo após o nascimento.
Está já em vigor a “idade zero” para o Bilhete de Identidade, permitindo que os cidadãos possam ter o seu Bilhete de Identidade desde o nascimento. Adicionalmente, o Executivo aprovou recentemente o Programa de Universalização do Bilhete de Identidade, que vai permitir aumentar a capacidade de emissão e entrega do Bilhete de Identidade, bem como aproximar este serviço dos cidadãos com a criação de postos de emissão ao nível dos municípios.
A “educação na primeira infância” e a “educação primária” são outros dois compromissos importantes para com a criança, que exigem de nós a adopção e implementação de políticas com vista o aumento da oferta e a melhoria da qualidade da função educação. Por isso, são regulares as medidas no domínio da construção de escolas e de admissão de professores para aumentar a oferta do serviço e diminuir o número de crianças que se encontram fora do sistema de ensino, bem como as que se encontram em turmas sobrelotadas. No presente ano lectivo, ao nível do ensino geral, estão inscritos mais de 9.200.000 alunos, tendo sido disponibilizadas para a iniciação e para a 1.ª classe um total de 1.600.000 vagas para ingresso pela primeira vez.

A protecção da criança exige também que assumamos o compromisso com a “prevenção e combate à violência contra a criança”. Estes crimes, porque têm o potencial de comprometer o futuro das crianças, devem merecer do Estado e da sociedade a mais firme e exemplar repulsa. É neste quadro que, de entre outras medidas, o Executivo angolano se prepara para propor a alteração da lei penal com vista o agravamento das penalidades aplicáveis aos crimes contra a criança.
Quem viola sexualmente uma criança, quem promove o tráfico de crianças ou dos seus órgãos, quem promove a prostituição infantil, entre outros crimes, tem que ser sancionado sem contemplações.
No topo das prioridades deve ainda estar o compromisso voltado para a “protecção social e competências familiares” particularmente das famílias mais vulneráveis. O programa Kwenda, por exemplo, tanto na vertente de transferências monetárias, quanto na vertente de inclusão produtiva, é a prova deste compromisso, estando a desempenhar um papel fundamental no fortalecimento da resiliência das famílias, contribuindo para a diversificação das suas fontes de rendimento, tendo em vista o objectivo de “não deixar ninguém para trás”. 94 Municípios, 328 Comunas, 15.375 aldeias, 1.667.906 agregados familiares cadastrados, 1.061.746 agregados familiares pagos, Kz. 108 mil milhões entregues às famílias, entre outros, sãonúmeros do Programa até Agosto de 2024 que não deixam dúvidas quanto à sua importância e, sobretudo, quanto ao seu impacto efectivo na vida de muitas famílias.
Não menos importantes são os compromissos ligados à “justiça juvenil”, à “prevenção, tratamento, apoio e redução do impacto do VIH/SIDA nas famílias e crianças”, entre outros.
Os resultados no domínio do cumprimento dos 11 compromissos com a criança e da implementação Política Nacional para a Primeira Infância motivam-nos a continuar a trabalhar com o objectivo de produzir ainda melhores resultados e assim melhor proteger o superior interesse da criança.
Minhas senhoras e meus senhores
Excelências
A Administração Pública deve agir com base no princípio da boa administração, o qual demanda a adopção e a execução de medidas de política racionais e eficientes, privilegiando a boa utilização dos recursos públicos e a utilização dos recursos a favor da prossecução do interesse público, tendo o cidadão como o seu objectivo principal.
Alcançar bons resultados exige que tenhamos, para além de instituições e órgãos responsáveis pela definição e implementação das políticas, instituições externas de controlo, capazes de assegurar a correcta aplicação dos recursos públicos. É aqui que o Tribunal de Contas é chamado a intervir, cumprindo o seu mandato constitucional de ser o “órgão supremo de fiscalização da legalidade das finanças públicas e de julgamento das contas”.
Não posso deixar de realçar, por isso, a “ousadia” (no bom sentido) do lema escolhido para estas jornadas técnico-científicas: “o controlo externo e as políticas públicas para a primeira infância”. Sublinho a expressão “políticas públicas”, que pode remeter-nos para um controlo para lá do controlo financeiro. Dois dias de debate, temas profundos e preletores competentes dão-nos garantias de uma profunda reflexão sobre estes e outros aspectos, sem dúvidas importantes para que tenhamos um contolo externo cada vez mais efectivo.

Contudo, algo parece evidente. A separação de poderes e interdependência de funções, enquanto princípio estruturante do Estado de Direito, demanda que evitemos uma visão estática, exigindo cada vez mais que o olhemos como um princípio vivo e dinâmico. Neste sentido, esta separação e interdependência é também “cooperação” para a prossecução dos fins do Estado, de que todos somos parte.
O Tribunal de Contas tem também, por isso, um papel pedagógico para com as instituições responsáveis pela implementação de políticas públicas, na medida em que usam recursos públicos.
Estou também convicto de que o Tribunal de Contas deve ter à sua disposição os mais amplos mecanismos para assegurar a correcta aplicação dos recursos públicos destinados à implementação de políticas públicas e à observância da legislação que rege o funcionalismo público, no que respeita às finanças públicas. Compete ao Tribunal de Contas assegurar uma gestão eficiente dos recursos públicos, evitando desperdícios e garantindo a boa realização do investimento público. A boa actuação deste Tribunal contribui, igualmente, para a promoção de uma maior transparência na gestão da coisa pública.
Caros conferencistas
Excelências
Angola é uma País de crianças e jovens. Estima-se que cerca de 50% da população tenha entre 0 e 15 anos. Não há, pois, dúvidas quanto a importância estratégica da existência de uma Política Nacional para Primeira Infância e da sua correcta e rigorosa implementação, bem como da necessidade de existência de adequados mecanismos de controlo externo. Dela depende o futuro do nosso País.
O futuro do País, contudo, é hoje! Por conseguinte, a criança não é futuro, é presente. É hoje que temos que investir nelas para que haja uma amanhã seguro e sustentável.
Neste ano em que celebramos 50 anos de Independência e nos propomos reflectir sobre o nosso presente e sobre o nosso futuro, esta reflexão sobre a implementação da Política Nacional para a Primeira Infância ganha especial importância. Parabéns ao Tribunal de Contas por esta iniciativa, que coloca a criança como uma preocupação do presente e não do futuro.
Não posso deixar de felicitar o Tribunal de Contas, o seu Plenário e o colectivo de colaboradores pela celebração do 24.º aniversário desde a sua fundação. Somos testemunhas de que são 24 anos de desafios e de superação. São 24 anos de afirmação e de progresso. O Tribunal de Contas é hoje uma instituição incontornável do nosso sistema judicial, desempenhando um papel decisivo na salvaguarda do princípio da boa administração.
A Administração Pública precisa do Tribunal de Contas para ser mais eficiente. Os cidadãos precisam do Tribunal de Contas para assegurar que os recursos financeiros públicos sejam melhor utilizados e que as políticas públicas produzam melhores resultados nas suas vidas. O País precisa do Tribunal de Contas para a contínua concretização e fortalecimento do Estado de Direito.
Formulo votos de uma muito frutífera jornada de debate e reflexão, convicto de que daqui sairão contribuições importantes para uma melhor implementação da “Política Nacional para a Primeira Infância”, a bem das nossas crianças e a bem do nosso presente.
Bem-haja!